sábado, 9 de abril de 2011

sobre LUZ NEGRA, por Adelice Souza

Há uma frase de Maffesolli que diz que “o imaginário é uma realidade”. Então a arte, produzida pelo imaginário, é real? Deparei-me com este pensamento ao assistir a peça Luz Negra, no Teatro Sesi. O dramaturgo salvadoreño, Álvaro Menén Desleal, propõe um universo descrito como “realismo fantástico” ao elaborar um diálogo entre duas cabeças desprovidas de um corpo. A proposta estilística é muito própria aos escritores latino-americanos como Cortazar, Borges, Garcia Marques, entre outros. E é evidente que eles usam imagens lidas como fantásticas, maravilhosas ou absurdas para tratar de uma realidade que não poderia ser tratada de outra forma, uma vez que são fantásticas, maravilhosas, absurdas e cercadas de todo o perigo da vida real que as alimenta. Assim, de uma forma real e concreta, a montagem de Luz Negra traz para o palco visões e transfigurações de um universo que nos parece utópico porque não é reconhecido como realidade imediata e, no entanto, eu, espectadora, encanto-me ao ver que o teatro ainda é este lugar privilegiado da possibilidade de criar mundos. Não somente a transposição de nossas realidades psíquicas, como aquelas que construímos ao ler uma obra literária. Mas mundos imaginários, realidades psico-físicas improváveis que se tornam concretas num palco e nos arrebata. Luz Negra, por se tratar de um texto “não-realista” deixa evidente esta discussão, revelando interpretações delicadas e profundas de todos os profissionais envolvidos, desde a primorosa direção que cria no palco um mundo mágico que nos desloca no nosso vão cotidiano, passando pela atuação dos atores, criando sensibilidades nas suas partituras vocais e corporais, até as imagens, cores e sons elaborados pelos outros elementos do espetáculo. De Luz Negra vem a força e a certeza da possibilidade do teatro de nos surpreender criando mundos que só seriam possíveis lá, em  seu espaço encantado de luz e sombras.

ADELICE SOUZA nasceu em 1973 e mora em Salvador (Ba). É diretora teatral, arte-educadora e ensina na Faculdade de Teatro da UFBa. Em 2001, ganhou o Prêmio Copene de Literatura, publicando seu primeiro livro de contos "As Camas e os Cães" (Editora Casa de Palavras). Este mesmo livro, em 2002, ganhou o Prêmio José Alejandro Cabassa (União Brasileira dos Escritores- RJ). Em 2003, ganhou o Concurso de Contos do Banco Capital com "Caramujos Zumbis", seu segundo livro. No teatro, dirigiu, entre outros - Jeremias, o Profeta da Chuva (14° montagem do Núcleo de Teatro do Teatro Castro Alves 2009), Na Solidão dos Campos de Algodão (2003), De Alma Lavada (1999), Hamlet-Machine (1997)

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